Terreiros Digitais são nossos tambores, a primeira internet do mundo
Terreiros Digitais são estações tecnológicas distribuídas em pontos de interação em rede nas cinco regiões do país. Construídos de forma colaborativa, em territorios vulneráveis, permitem o acesso à internet e às ferramentas que habilitam nosso povo à comunicação contemporânea, potencializando a comunicação comunitária e colaborativa. A conexão entre povos de terreiro que sempre existiu no mundo off-line passa, então, a dialogar online. E a partir do nosso olhar.
A metodologia dos terreiros digitais foi desenvolvida a partir do reconhecimento da importância dos saberes ancestrais, bem como o seu valor enquanto ciência. Temas transversais da ecologia, da cultura e do conhecimento são compreendidos como tecnologias que foram passadas através de gerações por mestres e mestras. Com as ferramentas digitais, os terreiros conectados estabelecem relações intergeracionais que permitem abordagens contemporâneas de nossas tradições.
As estações digitais permitem interação em tempo real e a participação ativa das atividades e percursos promovidos pela Rede Afroambiental. Com o mapeamento dos espaços cria-se, de maneira colaborativa e sustentável, áreas de produção, de comunicação, de economia solidária e ações para proteção ao meio ambiente e à nossa cultura. O site da Rede Afroambiental e toda a articulação preparatória para a Cúpula dos Povos, da Rio+30, já é resultado dessai interatividade.
Nosso objetivo é implementar uma comunicação com outro olhar – um olhar da cultura, com o olhar da arte, com o olhar da literatura – dentro de uma ancestralidade e uma corporeidade que se contrapõe a um sistema de poder que inviabiliza, impede e invalida saberes produzidos pela maioria da população brasileira.
Nossa comunicação vem de longe, pois o tambor, para os povos e comunidades tradicionais de matriz africana, é a primeira internet do mundo. Ele carrega o poder agregador da memória, essa memória coletiva que nos faz sentir fazer parte de uma família.
Nossos ancestrais escravizados, vindos de diferentes lugares da África, se comunicavam por olhares nos navios negreiros. A comunicação estabelecida, um texto sem palavras, também existia nas senzalas, no Correio Nagô e existe até hoje. Está nos terreiros, nos nossos corpos.
Estamos atualizando nossas conexões e ampliando a capacidade de circulação dos bens simbólicos, produtos, serviços culturais e artísticos dos povos e comunidades tradicionais de matriz africana. Precisamos saber a receita do angu para, em seguida, adicionar dendê e pimenta. Os Terreiros Digitais retomam o discurso de nós sobre nós mesmos.